Yves Saint Laurent, notas de uma visita



Faz um ano que Yves Saint Laurent morreu, e é possível ver um pouco do seu legado na exposição “Yves Saint Laurent, Viagens Extraordinárias” que fica em cartaz até o dia 19 de julho no Centro Cultural Banco do Brasil no Rio de Janeiro.

É impossível pensar na história da moda do século XX sem pensar em Saint Laurent. Podemos dizer, a grosso modo, que ele deu continuidade a idéia de Chanel, buscou no guarda-roupa masculino maneiras de deixar a mulher mais confortável e de acordo com o seu tempo e suas conquistas. Saint Laurent enxergava além... Viu a margem esquerda do Rio Sena, valorizou a juventude efervescente dos anos 60 e a valorizou como potencial consumidora, casou arte e moda muitas vezes. E YSL era um grande detetive de tendências nato. E é aí que entra a exposição carioca.

Muito antes das agências que detectam comportamentos cobrarem fortunas para viajar o mundo e dizer às marcas de moda no que elas devem apostar na próxima coleção, Saint Laurent detectou o “étnico” (expressão tão usada hoje em dia) por pura paixão pela cultura de outros países.

Yves Saint Laurent usava elementos das indumentárias tradicionais de cada país para criar suas roupas. Não deixava passar nada: estampas, amarrações, proporções, caimento, tecidos, acessórios, cores, e por que não a alma de cada país. Adaptava tudo ao gosto das mulheres.




Rússia







Índia






Ásia - China e Japão









Espanha






Marrocos
Saint Laurent adorava o país e tinha uma casa em Marrakesh, palco de muitas festas.







África







Crédito:
laura artigas / moda pra ler e
croquis e fotos "Espanha" - divulgação exposição

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Aqui um vídeo que gravei durante minha visita:




Como desbravador de culturas abriu caminho para que muitos estilistas seguissem suas idéias. Ele traduzia em roupa suas sensações, nesse sentido ouso dizer que por isso seu processo criativo era tão doloroso quanto magnífico.

No documentário “Yves Saint Laurent, o tempo redescoberto” ele revela suas personalidade triste e profunda. O filme, aliás, um registro fundamental da personalidade desse criador, e foi exibido recentemente no MUBE em SP, de graça. Quorum baixíssimo, aliás. Estudantes de moda de São Paulo fiquem ligados para não perderem oportunidades como essa.

Para conhecer mais sobre Yves Saint Laurent:

Fondation Pierre Bergé Yves Saint Laurent - http://www.fondation-pb-ysl.net

Sua Biografia “Yves Saint Laurent”, de Laurence Benaïn, editora Siciliano, encontrado facilmente em sebos.

E esse textinho reflexivo que a Danuza Leão escreveu no dia 27 de junho em sua coluna na Folha de S. Paulo.

Por Danuza Leão
Glamour, para esquecer o Senado

Não há nenhum costureiro que faça um vestido de noite que chegue aos pés dos que fazia St. Laurent

OUTRO DIA fui ver a exposição de St. Laurent no Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio, e fiquei boquiaberta com as coisas que vi. Não foi uma surpresa, pois sempre acompanhei o trabalho do mais talentoso de todos os costureiros que já existiram, mas como ando meio desligada da moda, havia esquecido das maravilhas criadas por St. Laurent ao longo de 40 anos.

Ninguém vai negar o mérito de Balenciaga, Chanel ou Dior, mas, no fundo, eles copiavam a si próprios a cada coleção -exceto quando Dior criou o "new look". Já St. Laurent buscou inspiração na África, na Rússia, na Espanha, no Marrocos, na Ásia e nem sei mais em que outras culturas e adaptou-as a seu modo, cada uma mais linda que a outra. E mais: enquanto os outros costureiros ficavam no preto, branco, bege, cinza, marinho, e mais ou menos só, St. Laurent ousou colorir o universo feminino, misturando cores que nunca ninguém, em seu maior delírio, teria coragem de ousar. Rosa-choque com vermelho, roxo com amarelo, laranja com verde -não, o mundo nunca havia visto isso antes.

E inventou o smoking para as mulheres, o que mudou todo o conceito de como se vestir elegantemente à noite; foi o supra-sumo de um achado simples e audacioso, o preferido do costureiro. Em uma entrevista, St. Laurent disse que a única coisa que lamentava em sua vida era não ter inventado o jeans. Só um gênio como St. Laurent diria isso.

Depois de ter visto a exposição, fui ver o vídeo que é um apanhado de todo o seu trabalho, e a tristeza do final, quando ele, já mal de saúde, fragilizado, vai à passarela pela mão de sua grande amiga Catherine Deneuve; nada a ver com o garoto que aos 19, 20 anos tomou o lugar daquele que até então era o maior de todos, Dior. E depois, no mesmo vídeo, uma bela entrevista do tímido, sensível e genial costureiro.

E fiquei pensando nesse -aliás, naquele- mundo de sofisticação, glamour e luxo que não existe mais.
Não há nenhum costureiro que faça um vestido de noite que chegue aos pés dos que fazia St. Laurent; apesar de nunca ter pertencido verdadeiramente a esse mundo, andei perto dele, e sabia do que acontecia nos salões. Grandes festas eram oferecidas por milionários como o rei do estanho, Antenor Patiño, originário de um país tão pobre como a Bolívia, o triliardário mexicano Charles de Bestegui, nascido em um país na época tão pobre quanto o México, e o também riquíssimo chileno Arturo Lopez, todos conhecidos por seus bailes em Paris, em Veneza e em Estoril, que ficaram na história do jet-set. Eram todos temáticos; ou um baile de máscaras, ou oriental, ou recordando Proust, cada um com mais de mil convidados, todos vipérrimos, atrizes internacionais, magnatas poderosos, e nobres, muitos nobres. Um jornal da época fez um delicioso comentário: "submersos num mar de tanta aristocracia, nem se pode compreender como existem tantas Repúblicas".

A exposição de St. Laurent me fez viajar no tempo e lembrar destas festas inacreditáveis que eu, apesar de não tê-las frequentado, soube como eram por amigos que tinham ido. E percebi, mais do que nunca, o que já sabia: que o mundo mudou, e para sempre. Nunca mais haverá um St. Laurent -comparem uma foto dele, sempre elegantíssimo, usando gravata mesmo quando trabalhando no seu ateliê, com uma de Galliano, de lenço de pirata e brincos.

Nunca mais acontecerão bailes como aqueles, nem haverá mulheres tão bonitas e glamourosas como Audrey Hepburn ou Jerry Hall, tudo isso acabou. Quem viu viu, quem não viu soube, e quem nunca viu nem soube vai morrer sem ter visto e sem saber.
E não compreendo que no ano da França no Brasil uma exposição tão importante tenha sido mostrada apenas no Rio, quando teria a obrigação de ter ido também para São Paulo. Uma bela pisada na bola de parte dos organizadores.


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Na minha opinião outra pisada de bola foi o catálogo com impressão em papel de péssima qualidade.

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Não está na exposição, mas para mim essa é a obra prima de Yves Saint Laurent: o vestido Mondrian.


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Aficcionados por livros de moda, cuidado com a livraria da Travessa. Durante a visita ao CCBB, além do catálogo levei também - A autobiografia do Paul Poiret e O Pequeno Dicionário da Moda do Christian Dior.

Comentários

  1. Adorei o post. Pra quem não mora no Rio e não pode viajar.

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  2. Nossa eu amo ir ao CCBB! Estou com tantas saudades de ir p/ lá!
    Tem sempre ótima exposições, peças,...A-M-O!!!

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  3. Ótimo como ele conseguia traduzir essa explosão de cores em inventividade. Quando li semanas atrás o texto da Danuza, confesso: fiquei pensando que exposições como essas deviam ganhar o Brasil e não ficarem restritas a um só lugar.

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  4. Adorei o post! YSL foi um dos três gênios da moda no sec. XX (junto com Dior e Chanel), e diferentemente dos outros, ele abusava da fantasia para criar para mulheres mais modernas e exoticas. O mais interessante é que ele raramente viajava!
    Pena que a expo não vem para SP!!

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